Pages

sábado, 19 de março de 2016

Sou metamorfose ambulante
Sou mutante
Sou gigante em mim
Cachorro perdido na mudança
Festa de criança
Confusão

O que me apetece
é o modo difícil de todas as coisas
Brusco
Bruta
Sem apelo e com pouco apego

Mudo
Porque ter sempre a mesma casa não tem graça

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Maria Sete Faces

Hoje sou Maria
Não aquela virgem e pura
Mas sou Maria de amor
Que se apaixona e chora
Erra, sofre e abandona
Escolho não ser escolhida
Porque eu sou a mulher da minha vida
Madalena não arrependida
Chuto as pedras no chão
Hoje, ninguém me levanta a mão
Sigo assumindo meus vícios
Enquanto o mundo desconhece meus sacrifícios
Sou Maria da Dor
Da dor de um parto desumano
Sozinha num quarto lotado
Da dor dos mamilos rachados
Do filho que chora de dor
Na fila do hospital
Do filho que chora de fome
Do filho que faz a mãe chorar
Da dor de ser uma família inteira
Sendo uma só mulher
Maria sem José
Maria de cama, mesa e banho
Forno e fogão
Serviço de mulher
Virar massa na obra
Virar massa de pão
Maria que é chefe de peão
Letrada, bacharel, graduada
Filha da Maria analfabeta ignorada
Menina Maria que entrava na escola de barriga vazia
Como iria sair de cabeça cheia?
Quatro irmãos menores pra criar
E a casa da madame pra limpar
Pobre Maria
Casou-se pensando na vida melhorar
Tornou-se escrava do lar
Maria da Cruz
Chora no silêncio da casa vazia
Crucificada foi
Por amar outra Maria
Puta, vadia
Falta um homem pra você
Vai apanhar pra aprender
Puta!
Com essa saia curta
Queria o quê?
Eu quero viver!
Me tire as amarras
Liberte meu corpo, minha alma
Meu nome, meu sexo
Eu não te devo nada
Sou Maria
Me respeita!

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Um grito de água

Água?
Vida!
Quem mandou você meter a mão?!
Água, fonte de destruição...
Culpa da água?
Da água não!
Água na boca, água na bica
Água que não tá boa
Água desceu
Boca secou
Bica fechou
Água subiu
Ponte sumiu
Ninguém viu
Água...
Salgada no choro do sertanejo
Cansada no suor do ribeirinho
Rara que não cai do céu
Cara quando enlatada
Água no teto,
na poça no chão
Infiltração
Água na terra seca
Que não encharca
Matando o gado
Água que arrasta o barranco
Desfaz o encanto
e desmonta o barraco
Água na fonte
Cartaz do seu comício
Desperdício
Água que é o início
Fez-se dela o fim
O seu sim que fez o não!
Quem mandou você meter a mão?!