Pages

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

A esperança preta que hoje renasce

Sou mais que a passista curvilínea que enlouquece a arquibancada e faz a bateria perder a harmonia.
Sou mais que o negro viril, que rodeia fantasias sexuais da mulher branca.
Sou a faxineira que você odeia e de quem você ri nas suas redes sociais. A mesma que lava a sua roupa e limpa seu lixo e cujo trabalho você jamais seria capaz de fazer igual e não sobreviveria sem.
Sou o pedreiro que aos seus olhos passa o dia bolando cantadas machistas, mas que aguenta o sol na lata ao meio-dia de pé, enquanto você desfruta do ar-condicionado sentado à sua mesa no escritório.
Sou aquele a quem você profere ódio todos os dias, a quem você nega a história, a identidade, o espaço, os direitos e nega respeito.
Hoje é 24 de dezembro e a despeito da sua crença, meu Jesus que renasce esta noite é preto e com ele renasce a esperança preta de superar toda barreira que o ódio tenta me impor.
Sou toda a superação e resistência dos meus ancestrais que me trouxeram até aqui.
Sou Cristo e sou Zumbi.

sábado, 23 de agosto de 2014

Rabisco sobre o dia


Dorme cedo
E vai amanhã 
Sem medo
Cortar a fita
De um novo dia
Que se inicia
Com o suor da sua testa
Dia de fazer festa
A festa da sua vida
Há quem diga
Que é bonita
Então comece sua luta
Pois o dia é de marmita
Quente ou fria
É o que te sacia
Mas o que alimenta
A sua mente
É a meta
E hoje,
De um jeito diferente
É dia de fazer de novo
O que já foi feito
Um dia


domingo, 10 de agosto de 2014

O segundo domingo

Pra todo padrão e estereótipo já criado, a vida e o passar dos tempos se encarregaram de criar novas versões. Mesmo assim, sempre existirá quem queira se manter preso ao que aprendeu ser certo um dia e por isso classifica como incerto quem diferente for.
Quando criança não aprendi a soltar pipa, nem jogar bola e brincar na rua não podia. Passava as tardes com minhas bonecas, brincado de casinha e de fazer as coisas que hoje só faço por obrigação e necessidade mesmo. Eu era menina.
Hoje sou mulher. Só pude me entender assim após ser mãe [de um menino]. 
Hoje já não acredito em separação de gêneros, não acredito em padrões. Azul cor de menino, rosa cor de menina. Boneca, bola. "Ele é menino, corta o cabelo dele". Acredito em coisas de criança, coisas de adulto.
Aprendemos na infância que em casa existe uma mamãe e um papai. Quando o padrão não é esse,é como se faltasse alguma coisa. Não falta!
Aqui tem alguém que dá carinho, brinca, ensina e faz dormir e que tem pouco tempo pra isso. Garantir o leite de todos os dias requer um tanto de ausência diária.
Chega a ser mágico poder ensinar um menino a fazer xixi em pé, quando essa não é a minha normalidade. Não nos faz falta ter um 'lulu' pra servir de modelo.
Não nos faz falta ter outro ombro forte pra carregar criança cansada. Minha força física tem sido suficiente.
Não nos faz falta ter alguém ligado em tecnologia, economia, ferramentas e política, porque nós podemos ter isso tudo e tudo mais que for necessário. 
Quem vai ensiná-lo a jogar bola? Advinha?? A mamãe aqui. Mesmo sem nenhuma habilidade pro esporte.
E a mesma mamãe, em breve vai aprender a soltar pipa pra poder ensinar ao filho e assim brincaremos juntos. E um pouco mais pro futuro aprenderei a dirigir e ensinarei o meu filho também.
Ensinarei ao meu filho como se deve tratar as pessoas, sejam mulheres, homens ou que não se enquadrem em definições de gênero. Ensinarei que ser um homem de verdade é ser uma pessoa digna, honesta, de bom caráter que respeita o próximo.
Ensinarei que o padrão a ser seguido é o padrão do bem.
Sobre o segundo domingo de agosto, o segundo domingo de maio e os outros 363 dias, posso dizer que não nos falta nada, porque sobra amor.

domingo, 27 de julho de 2014

Eu escrevo por desejar profundo

Pra muitos a vida corre em ciclos. Eu mesma já acreditei nisso e talvez seja mesmo verdade. Porém o que sinto hoje e que vem sendo a minha verdade é que a vida está sendo bipolar. Transmuta de um extremo ao outro sem se importar com os efeitos. E toda essa confusão fica pra mim, cai naquela conta que eu nunca tive condições de pagar, numa dívida que só aumenta, o crédito nunca é suficiente. Quem fica no vermelho é um coração que sente ser mente e uma mente que nem sabe quem é. Ela tenta me fazer acreditar que tudo o que eu quero é extremo, quando não é. E o objeto do meu desejo parece ser a maior das utopias românticas, o sufocamento da liberdade e a vitória da opressão. Eu não aceito. Não aceito perder. Não aceito ceder. Essa concessão eu não aceito, não admito.
Não é impossível, nada é. Não me custa esperar, não tenho esse medo. Essa ciranda me faz mal. Eu me sinto como o cara que é igual a todo mundo e vive pixando muro e nunca leu o livro que ela ama nem viu o filme que ela adora. Sei que isso não existe e não mereço me colocar nessa posição, mas se o objeto se torna utópico, eu me sinto sempre um passo atrás, desinteressante e desapaixonante. E se alguém me diz o contrário eu desconfio, nunca foi verdade antes. Seria agora? Ainda não conseguiram me fazer acreditar. Essa minha rotina faz de mim uma mulher ocupada, por enquanto é só isso. Tudo mais que eu tenho a oferecer ainda não está pronto pra ser ofertado. Eu não me engano quanto a isso. Os outros é que não conseguem enxergar. Talvez nenhum deles estivesse realmente pronto pra minha complexidade. Qualquer outra coisa superficial não me cabe mais. Esse corpo é como a parte visível de um iceberg, tudo o que não pode ser visto é muito profundo. É muito mais intenso que o sexo marginal feito nas camas frias, mais sincero que os "bom dia" ditos com os dedos, muito mais carinhoso que os carinhos feitos com terceiras intenções. Migalhas não alimentam nem mesmo os pombos, não tem o poder de alimentar sentimentos, nem meia fatia, nem meia xícara. Quero copo cheio de café quente, forte e doce na medida. Aquele café fraco do dia-a-dia é uma satisfação ilusória, passatempo, não sustentaria uma vida. No mais, eu posso me deixar ser surpreendida, ser incompleta não me serve, não me veste, nem me seduz.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Poema do Bolo de Chocolate




O ouvido avisa
Que vem da varanda
A voz da vovó

- O bolo tá pronto!
E logo me apronto
Num passo que só

Bolo de chocolate
Que espalha o cheiro
Ah! É um chamego bom...

Eu bem ligeiro
Comi meu pedaço
Depois do recheio
Eu ganho um abraço

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Compartilhando o que é bom

Moço! Jeitinho com a moça
É delicada, a pele de louça
Que hoje você laça
Dona do ventre que dança
Meu quadril enreda
Quando doido me agarra
Minha mente embebeda
Tome tento viu... E saiba
Que dentro do alvoroço
Acontece mais coisa que se caiba
Tua boca em meu pescoço
Meus olhos sorridentes
Você já crava os dentes
E eu, seu moço
Mais menina do que moça
Tua pele me acoberta
Travessuras sim! Não minto
Quero o preto mais retinto
Com a sua mão que aperta
Penetra e encosta
Duas mãos em minhas costas
Enfia em qualquer vão
Minha mão em ti então
Faz assim faz!... E faz gostoso
Dedos, ombros me contorça
Assim com jeitinho em sua moça

domingo, 1 de junho de 2014

O Passarinho Preto




À sombra da grande árvore
ele deita mansinho
Já estava cansado, já estava com sono
é tão lindo meu passarinho

Tem penas pretas e asas curtas
e um bico amarelinho
Quando está feliz, ele canta
que alegria o meu pretinho!

Eu, na varanda sentado
Fico só a observar
Quando de repente do céu
Cai a chuva pra molhar

Shhhh...Dona chuva
Por favor, caia devagar
E não faça muito barulho
Pro meu passarinho não acordar


quinta-feira, 1 de maio de 2014

Sonora verdade

Ouço verdades presas
dentro de mentes perdidas
fechadas em corpos soltos
Verdades nervosas, desesperadas
Verdades lindas, acuadas

 - Que mundo é esse onde não temos espaço?
Onde nos calam, nos escondem.
Por que tem tanto medo?

Ouço verdades querendo ser livres
querendo ser ditas
Verdades querendo fazer o bem
Querendo ser paz.

Libertem-nas!
Gritem, chorem...
Deixem que escorram pelas faces
e que ecoem pelos ares
Sejam-nas!

sábado, 22 de março de 2014

Senzala Anos 2000




Senzala. Lugar que servia de "moradia" para os negros escravizados. Provavelmente um lugar cheio e apertado onde eles eram mantidos presos. Mas o significado dessa palavra vai além de definições de dicionário. Vai além da construção precária, do depósito. Senzala é o lugar onde, desde sempre, tentam nos fazer acreditar que é nosso, por direito deles. É o lugar de onde, tentam nos fazer acreditar, nunca deveríamos ter saído, nunca devemos sair. Ainda não saímos!

As negras, escravizadas, limpavam a casa, lavavam a roupa, faziam a comida, amamentavam e criavam os filhos das brancas enquanto seus próprios filhos não podiam desfrutar de sua atenção e cuidados. O regime de escravidão acabou oficialmente há 126 anos. Eu tenho 22 e cresci numa família onde as mulheres faziam e fazem exatamente os mesmos trabalhos. Não são obrigadas a fazê-los, mas também não tem outras opções.

Negros, escravizados, trabalhavam na lavoura, com a enxada em mãos, sob sol e sob chuva, nas construções, nos trabalhos braçais, na força bruta. E o que eu vejo hoje e que qualquer pessoa pode enxergar se quiser, são homens negros carregando cimento nas costas, com a mesma enxada em mãos, no chão de fábrica, com o uniforme sujo de graxa e tinta, com o uniforme laranja da Comlurb. A senzala está aí, nos pedreiros, porteiros, "peões" de fábrica, garis.

Sobre a representação de negros na televisão, nós estamos lá, pra quem quiser ver. A empregada da mansão, a babá, o motorista da família, o faxineiro do hospital, o assaltante, o estuprador, sem contar as novelas de escravos né. Nos programas de culinária, os apresentadores são brancos, os chefs também, mas nós sabemos quem é que pica a cebola e lava os pratos, elas estão lá, no cantinho, quase no final do estúdio, com seus uniformes brancos. Falam de moda, de estampas étnicas e o estilista é branco, a modelo é branca, afinal, África está em alta. São eles, os mesmos que ensinam amarrações de turbantes em cabelos lisos. E nesse momento alguém vai questionar, "mas, e o carnaval?". Claro, estamos na ala de passistas, das baianas, nas baterias, alas da comunidade, então não tem problema a rainha da bateria ser ex-reality show.

Num pub local, a noite era de Jazz, a música de Billie Holiday, Louis Armstrong e Ella Fitzgerald, nossa música. Nós, é claro, estávamos lá. Na portaria fazendo a segurança, no balcão servindo a cerveja gelada e lá, no banheiro, limpando o chão. Mas isso não é exclusividade do Jazz, tem a noite do Soul, e a noite do Samba também.

Estamos em 2014 e meus irmãos são amarrados em postes como se ainda fosse século XIX, estamos em 2014 e todo camburão tem muito de navio negreiro. Os senhores de engenho estão aí em cada esquina espalhando o ódio racial, tentando fechar todas as portas que suamos e sangramos muito para abrir. Tentando acorrentar nossos pés para que nunca caminhemos lado a lado. Estão aí o tempo todo tentando nos fazer acreditar que quem nasceu pra Tia Anastácia nunca chegará a Dona Benta. E nós, por escolha dos outros, ainda não saímos da senzala.

domingo, 2 de março de 2014

Pobre Poesia

Pobres das palavras
Que não traduzem
Sentimentos, não produzem

Pobres dos sorrisos
Que enfeitam os rostos, em disfarce
Em farsa, as faces

Pobres dos olhos
Que não veem além
Das matizes da lente, na fronte

Pobre do corpo
Que não acolhe a alma, só
E volta à terra, ao pó

Pobres dos mortais
Querem ser deuses por amar
E os deuses querendo morrer de amor

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Ponha-se No Meu Lugar

Eu quero começar esse texto dizendo que é chato ter que falar sempre sobre isso, mesmo fazendo pouco tempo que tenho me dedicado realmente à causa. É chato porque é triste e dói. Quem gosta de sofrer? Mas entendi que assim é a luta, insistente, persistente, repetitiva e a cada repetição espera-se que alguém ouça e entenda a mensagem para que tudo faça sentido. A luta é em nome de todos que sofreram - na pele - antes de mim, por aqueles que ainda não entendem que vão sofrer e para que algum dia ninguém mais sofra. A luta racial é uma opção, mas pode ser que a própria causa faça seus escolhidos e então você percebe que não há como ficar de fora porque você já está dentro dela e ela dentro de você.

Acho que não precisamos mais questionar se existe racismo no Brasil (apesar das negativas) e que mais importante é apontar as diversas formas nas quais ele se manifesta todos os dias. É algo institucionalizado, enraizado e que se propaga como uma herança, de geração a geração. O mais preocupante talvez não esteja nas pessoas que o expressam livremente, não que seja melhor, acontece que o veneno está disfarçado com aqueles que julgam não ter preconceito e o espalham em tom de piadas e "frases inocentes". Esses, tomam posse da herança sem nem se questionar de onde ela vem e o porquê de existir. E assim o racismo se cria, se sua existência não é explícita o seu combate é falho. Esses herdeiros crescem e não conseguem enxergar fora de seu próprio eixo, fora da sua realidade.

Com o advento do "Poste do Justiceiros", a internet foi tomada por diversas opiniões e pontos de vista, dos quais muitos poderiam ser renomeados de pensamentos racistas. Entramos, sim,  na questão (sócio)racial, no momento em que entre essas opiniões, o que se sobressaiu foi a afirmação: "É uma questão de justiça, não de racismo". No meio disso tudo, pessoas falam como se negros quisessem sempre o lugar de vítima e como se competissem pelo primeiro lugar no sofrimento. É bom que essas mesmas pessoas saibam que por trás de cada um existe uma história, inclusive, cada "marginalzinho" também tem a sua. Não há como saber a história de cada um deles, mas todas elas tem algo em comum, algo determinante a ponto de não permitir que esses jovens sejam chamados de "cidadãos de bem".

Crime é crime, quem o faz tem que ser punido. Mas pensar de uma forma tão rasa, faz da criminalidade um ciclo que não se encerra. Já que é melhor prevenir do que remediar, olhemos então a raiz dessa situação. Tem gente por aí dizendo que a maioria dos jovens assassinados são negros, porque a maioria dos bandidos também são. Isso nada mais é que do que tratar sintomas como causa do problema. Não sou especialista em nenhum dos temas que estou abordando, mas eu sou negra, sou mãe e sou pobre, características que me credenciam a falar de algo que eu vivo.

Nasci e vivi até os dezesseis anos na periferia da cidade vizinha à que moro atualmente. Nesse bairro, só existia calçamento porque os vizinhos se uniram e o fizeram por conta própria, o primeiro asfalto que a prefeitura colocou, foi-se embora com a água da primeira chuva. O ônibus tinha um intervalo de aproximadamente uma hora entre um horário e outro. Para se conseguir uma consulta médica no posto de saúde era e ainda é preciso ir para a fila de madrugada, ás 4 horas da manhã, ou até antes. Nunca estudei numa escola perto de casa, minha mãe queria que estudássemos (meu irmão e eu) numa escola melhor do que aquelas, onde o ensino era fraco, faltavam professores. Há cinco anos moro na maior cidade da região Sul Fluminense, também na periferia e a situação aqui não é muito diferente. No posto de saúde do bairro, há uma pediatra, quando ela está de férias, o substituto que deveria assumir o posto, não aparece. E as crianças ficam um mês sem médico, podendo contar apenas com atendimentos de emergência nos pronto-socorros da cidade, cinco no total. Se a necessidade de atendimento é num fim de semana, só se encontra essa especialidade médica em um ponto de atendimento. Já fiquei três horas num domingo aguardando atendimento para o meu filho e ali estavam crianças ardendo em febre, esperando há mais tempo que eu. E já esperei onze meses para fazer um exame de vista.

Se essa realidade parece ruim, eu tenho plena consciência que existem outras muito piores, elas estão aí nos noticiários o tempo todo, miséria vende jornal. Talvez eu não consiga imaginar como é crescer num lugar onde você convive com a violência, tráfico e polícia na porta de casa. Um lugar onde não há nenhum médico, nem saneamento, energia elétrica. Imagina como é não ter o mínimo para viver com dignidade... As pessoas que estão aderindo a campanha "Adote um bandido", com certeza não imaginam o que é, e nem ao menos querem conhecer para não perder a posse de suas verdades absolutas e muito menos tentar entender.

Eu finalizo me apropriando do clipe de uma música que fala sobre preconceito racial nas formas mais banais do dia-a-dia do negro. Querem nos culpar por sermos  vítimas e querem nos culpar por sermos vilões, mas nós não somos representados nem em uma embalagem de xampu. Além da mensagem da música, o clipe faz uma coisa que tod@s que sofrem/sofreram algum tipo de preconceito gostaria que acontecesse, que o outro estivesse no seu lugar. Pois é mais fácil julgar, acorrentar, perseguir e atear fogo, quando não se sente na própria pele, na própria carne.





quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Vermelho Liberdade

Vânia não era uma mulher qualquer, mas também não era do tipo que servia de "modelo social". Sempre foi dona de seu corpo e sua mente, seus sentimentos e emoções. Dona, não. Comandante seria mais apropriado. Calculava sempre a profundidade para que o coração pudesse mergulhar e não se afogar. Observava bem as iscas, ele não seria fisgado por qualquer uma.
Numa segunda-feira dessas mal faladas e odiadas, ela se levantou, tomou um banho, bebeu um café amargo, se vestiu e foi... Foi para a rua, foi à luta. Sem saber, foi ao encontro de algo a mais dentro de si. 
Entre, prédios e ônibus, lá estava ela ganhando as calçadas. Na cabeça, buzinas, megafones e uma enorme inquietação. Um estalo! Vânia se deu conta que nunca havia se entregado. Nunca! Sempre a razão. Sempre outras coisas, sempre tudo antes. Praticidade, vida moderna, multitarefas. 
Então veio a vontade de não ter o domínio. Apenas deixar o corpo falar, deixar sentir. 
Enlouquecida pelo momento, entrou numa loja de maquiagem mais próxima e comprou um batom vermelho. Sim! Vermelho acabara de de se tornar a sua cor. A cor da sua libertação. Avistou um espelho e se pintou. Naquele momento decretou que se entregaria, a si mesma. Se permitiria ser. Só assim aconteceriam os melhores amores, as melhores paixões, as livres. Vânia livre.
Mais tarde, com suas novas certezas, entrou num bar, pediu uma caipirinha e esperou que a noite a surpreendesse.




terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Bate A Poeira

Essa música, além de ser de uma negra incrível que me inspira muito, tem uma letra que sintetiza um pouco do que é este blog e das coisas nas quais eu acredito.

Segue o som...





Os perturbados se prevalecem,
Enquanto atingidos adoecem
Palavras soltas que aborrecem
Esperança depois de uma prece
Um povo com crise de abstinência
Procura explicação pra existência
Num mundo onde dão mais valor pra aparência
Tem sua conseqüência

Negro, branco, rico, pobre
O sangue é da mesma cor
Somos todos iguais
Sentimos calor, alegria e dor
Krishna, Buda, Jesus, Allah
Speed Black profetizou
Nosso Deus é um só,
Vários nomes pro mesmo criador
Pouco me importa sua etnia
Religião, crença, filosofia
Absorvendo sabedoria,
Desenvolvendo meu dia-a-dia.

Nesse mundo poucas coisas são certas
Amor, sorte, morte, a vida que se leva
Do sul para o norte, da Ásia à América
Se é humano o erro te liberta
Seja o que tiver que ser, seja o que quiser ser
Bate a poeira, bate a poeira, bate a poeira
Seja o que quiser ser
Bate a poeira, bate a poeira, bate a poeira
Seja o que tiver que ...

O preconceito velado
Tem o mesmo efeito, mesmo estrago
Raciocínio afetado
Falar uma coisa e ficar do outro lado
Se o tempo é rei vamos esperar a lei
Tudo que já passei nunca me intimidei
Já sofri, já ganhei, aprendi, ensinei
Tentaram me sufocar mas eu respirei
Há tanta gente infeliz
Com vergonha da beleza natural
É só mais um aprendiz,
Que se esconde atrás de uma vida virtual
Gorda, preta, loira o que tiver que ser
Magra, santa, doida somos a força e o poder
Basta, chega, bora, levanta a cabeça e vê
Vem cá, viva, sinta, o que quiser você pode ser

Nesse mundo poucas coisas são certas
Amor, sorte, morte, a vida que se leva
Do sul para o norte, da Ásia à América
Se errar é humano, o erro te liberta

Seja o que tiver que ser, seja o que quiser ser
Bate a poeira, bate a poeira, bate a poeira
Seja o que quiser ser
Bate a poeira, bate a poeira, bate a poeira
Seja o que tiver que ...


quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Um Brinde À (im)Perfeição


Não esperava que esse filme tivesse uma cena tão boa como essa. É uma conversa simples que fala sobre algo que falo sempre aqui, que é ser mãe. No começo foi difícil aceitar que eu não era uma mãe perfeita, como aquela imagem da mãe que eu tive desde sempre. Não sou uma mãe como minha mãe é, e muitas vezes isso parece ser um grande pecado. Sou mãe e sou humana. Se eu não correspondo à expectativa, isso não faz de mim um monstro. Apesar de tudo, dos erros e falhas, das frustrações, e de em alguns momentos querer estar em uma realidade paralela, eu olho pro meu filho e vejo que tem saúde, é esperto e inteligente, está dentro da faixa de desenvolvimento esperado pra idade dele e é uma criança feliz. E isso faz valer toda a confusão mental que existe na cabeça dessa pobre mãe. Um brinde à mim!






quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Uma Casa No Campo Para Dois

Um poeta já disse
Querer uma casa no campo
Perdão, Senhor Poeta!
Por me apropriar dos versos teus
Que a mim soam tão lindos e tão legítimos...
Maravilhoso ficar do tamanho paz
Contando carneiros no jardim
Ouvindo a quietude do silêncio
Sem línguas, nem ouvidos cansados.
Querido Poeta,
Como não desejar teu desejo
Vivendo nesta Babilônia de aço?
Eu quero a esperança que vejo
Pelas lentes embaçadas de meus óculos.
Também quero um filho de cuca legal
E meus amigos com suas cucas maravilhosas
Ah! Como és sábio...
Aqui não sentimos mais a terra.
Não plantamos nem colhemos.
Não sabemos ao menos
Admirar uma flor.
Confesso que não tenho muitos discos e livros,
Porém tenho lembranças e sentimentos.
São tantos e precisam de espaço.
Do espaço ideal
E da simplicidade,
Para que não se prendam à matéria.
Senhor Poeta,
Quando realizares teu sonho
Peço-lhe um favor,
Não me leves junto à ti.
Apenas ensina-me o caminho
Que um dia eu chego lá.




domingo, 26 de janeiro de 2014

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Dentro Do Lado De Fora

Do lado onde estou, já não sei. 
Era o lado de fora. 
Eu estava dentro e não queria sair. 
Ar rarefeito, é o que tem. 
Cortinas, grades e muros.
Quase não dá pra ver o sol. 
Quase não dá pra ver o céu. 
É impossível voar. 
E minhas asas não param de crescer. 
Quase não tem espaço. 
Sufocada! 
Do lado de dentro era difícil. 
Possível.
Lá dentro tem cores.
Tem sonhos. 
Tem vôos. 
Tem sorriso e música.
Mudança.
Cérebro e coração se separaram. 
Não sei onde está cada um. 
Se perderam. 
Eu também. 
Dentro, há realização. 
Mobilidade.
Aqui, limitação... 
Ou não? 
Procuro pela Terra da Transição. 
Essa sim. 
Realidade utópica.
Dentro do lado de fora.
Fora do lado de dentro.
Necessidade.
Quietude.
Tudo.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Silva sim, Xica não!

Não uso peruca
Nem pinto meu rosto
Não me chame Xica
Não assumi seu posto

Meu cabelo não nega
A minha cor não pega
Sua cor não vai me pegar
Seu cabelo não vai me negar

Sou natural, não sou exótica
É biológico, umbilical
Não é ilusão a sua ótica
É negação institucional




Não posso obrigar alguém a gostar da minha imagem,
e ninguém pode me obrigar a me desfazer dela.


sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Eu canto Elza para defender a minha carne!

"- Aconteceu comigo. Eu tô respondendo um processo. É sério, não ri, de verdade. Eu tô respondendo um processo até hoje, por assassinato, entende? Olha pra mim e não ri. Tu acha engraçado mas eu acho triste. Eu quase não entrei pra casa por causa de processo. Eu falo nega, nego, porque é a que eu atravessei... que eu... desculpa. Sério. Ela era afrodescendente. E eu acho que assim, uma afrodescendente costuma se relacionar com? Com afrodescendentes. E eu pensei, pô, aguenta tudo. E eu atravessei. E eu até hoje sou acusado de assassinato, entende?"

(Transcrição da fala de um sujeito que atende pela alcunha de Cássio durante uma conversa ocorrida  no BBB)


Eis que nós temos a lei 10.639, temos as cotas nas universidades, cotas nos concursos públicos, cotas nas empresas privadas, temos a Seppir, temos Joaquim Barbosa e temos Mercado Livre (MAIOR site de compra e venda), permitindo o anúncio da venda de negros a R$ 1,00, temos repressão ao "rolezinho", temos a máxima exposição do corpo da mulher negra, temos a reprodução do mercado de escravos, temos a "preferência" da Fifa, temos(?) Amarildo e temos, por fim um participante do maior reality show do Brasil, que antes do trecho citado, teve uma postagem apagada de sua conta no Twitter em que ele diz sentir falta do tempo em que ter escravos não era crime.
Na emissora de maior audiência no país, ter uma pessoa que explicita esses pensamentos, e reproduzir essas falas, só reforçam o que estamos diariamente tentando combater, mas esse compromisso social, nós sabemos que não existe por parte dessa mídia.
Eu já passei pela fase de pensar que abafando notícias como esta, estaria coibindo o racismo. Mas não, é com a tristeza de reler estes casos e com a motivação da luta que reproduzo aqui essas notícias. Eu quero olhar na cara do racista e dizer: "Você não vai me escravizar novamente! A minha carne não está à venda!"

P.S: Sobre o caso do BBB eu não entendi diretamente a relação entre o sexo e a morte da garota e não encontrei esse caso do processo na internet, se conseguir atualização do caso eu exponho aqui.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Vida, vida, vida...

A vida é uma linda mesmo. Uma querida.
Ela consegue, com pequenos argumentos, me mostrar sempre que eu estou errada, sempre errada.
Que mesmo que eu esteja certa, estou errada.
Ela consegue por em dúvida meus princípios e minhas crenças.
- Ei, mocinha! Onde você pensa que vai com esse seu idealismo barato? E essa sua razão? Tsc, tsc...Volte aqui agora!
Minhas verdades, de frágeis se tornam mentiras.
A vida segue, eu tento.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Muito prazer, mãe e profissional!

-Tem filho?
-Tenho.
-Ah, não pode ter filho.

Esse foi o fim de um diálogo recente, que eu me dei conta que é um diálogo corrente com muitas mães. Existe uma vaga de emprego e entre os requisitos está "não ter filhos". Eu sei e todo mundo sabe da dependência de uma criança pequena, porém a partir do momento em que a mãe vai procurar um emprego é porque ela tem essa possibilidade de trabalhar.
Enfim, o caso aqui não é esse, até porque eu nunca ouvi de nenhum homem ter sido rejeitado por um contratante por ser pai ou que perdeu o emprego por ter que sair cedo em caso de emergência com @ filh@.
Fiquei pensando que para a "sociedade", um homem que tem filh@ tem por obrigação trabalhar. Um homem que tem filh@ passa credibilidade ao se candidatar a uma vaga de emprego, pois o raciocínio é o seguinte: "tem filh@, será comprometido com o trabalho, responsável, tem que levar o leite para casa".
Se o raciocínio é esse, porque aquele diálogo inicial existe? Ah sim, desculpe, me esqueci que agora é a parte em que eu falo da mãe. A mãe foi feita pra cuidar d@ filh@, ficar em casa e não para o mercado de trabalho, porque a parte do dinheiro é com o pai.... Mas.... e se não tem pai? E se o pai não participa? Ou se simplesmente essa mãe quer trabalhar porque gosta e porque sabe que lugar de mulher é onde ela quiser estar? E aí, como faz?
Vivemos numa época em que mulheres são chefes de estado e que ainda se rejeita uma profissional por ela ser mãe!!!
Criança dá trabalho, existem emergências, existem as viroses e doenças da estação, mas assim é a vida de qualquer pessoa. Junto à mãe que trabalha existe alguma estrutura, seja a família, a creche, o pai, que a possibilite sair de casa, que a possibilite ser também uma profissional.
Já sofremos preconceito por ser mulher e querem nos impedir de sermos donas de nossas vidas, de sermos chefes de família, de sermos livres mais uma vez. Não vão conseguir!